Serra Pelada é uma região situada na Serra dos Carajás, no sul do estado do Pará e é famosa por ter abrigado o maior garimpo aberto já registrado na história. O garimpo de Serra Pelada atingiu seu pico de atividade entre 1980 e 1983, tornando-se o maior garimpo a céu aberto do mundo. Na época, milhares de garimpeiros buscaram enriquecimento rápido através da extração de ouro no local.
Quer saber mais sobre o assunto? Confira abaixo os principais acontecimentos e marcos desta história.
Como começou a exploração de ouro em Serra Pelada?
Existe uma diversidade de opiniões a respeito do início da corrida do ouro em Serra Pelada. No entanto, a versão mais aceita é a de que Genésio Ferreira da Silva, antigo proprietário das terras na área, teria descoberto um mineral atípico enquanto realizava escavações para construir uma cerca próxima a um curso d’água, no final da década de 1970. Inicialmente, desconhecendo o tipo de material encontrado, Genésio se dirigiu a Marabá, onde, após uma análise, descobriu tratar-se de ouro.
Genésio contratou aproximadamente trinta garimpeiros para trabalhar na extração de ouro na região, e em um período de duas semanas, mais de trinta quilogramas do metal precioso foram retirados. A notícia se espalhou rapidamente e cinco semanas depois, cerca de três mil pessoas se dirigiram ao local em busca de fortuna. Em 1980, o número de pessoas na região ultrapassou cinco mil.
Entretanto, o auge da exploração viria em 1983, quando os garimpeiros extraíram cerca de 14 toneladas de ouro, segundo dados do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), atual Agência Nacional de Mineração (ANM).
Estima-se que cerca de 100 mil pessoas trabalharam para retirar 42 toneladas do minério ao longo da década de 1980 e início da década de 1990 em Serra Pelada.
Devido à exploração do ouro, a região atraiu médicos, enfermeiros, lavradores, engenheiros, motoristas, padres, dentre outros. Com o aumento do número de garimpeiros no local, o governo federal interviu com objetivos políticos e econômicos. Assim foram instalados órgãos como polícia federal, receita federal, correios e a caixa econômica federal. Para evitar confusão, foi proibida a entrada de mulheres e bebidas alcoólicas no local, e o major do exército Sebastião Curió foi designado para organizar o garimpo na região.
No garimpo só era possível vender o ouro extraído para a caixa econômica federal, e o valor pago era fixo.
Com o grande número de pessoas em Serra Pelada, os familiares dos trabalhadores começaram a se assentar a cerca de 30 km do local. Por consequência, na década de 1980, foi fundada a cidade de Curionópolis, a qual foi denominada em referência ao coronel Sebastião Curió.
Dia-a-dia dos trabalhadores em Serra Pelada
O ambiente de trabalho era precário e improvisado, o que resultou em condições perigosas para os garimpeiros. Eles sofriam com o calor intenso, escadas comprometidas, barrancos sem medidas de segurança e contaminações pelo ar, barro e mercúrio. Infelizmente, essas condições levaram à ocorrência de diversas mortes.
A vida dos trabalhadores era difícil. Apesar de existir uma organização e comércio florescendo na região, a maioria dos funcionários mal conseguia sobreviver. Eles não tinham acesso a uma cama decente e dormiam em galpões lotados, usando apenas redes.
Os garimpeiros acordavam já de madrugada, por volta das 04 horas, e trabalhavam até às 20 horas. A comida era básica, geralmente consistindo apenas de carne com farinha. Eles guardavam suas poucas posses em sacolas de pano. Dentro da cava, o espaço era apertado e os trabalhadores se amontoavam nos diversos barrancos e escadarias do garimpo. Tudo isso levou Serra Pelada a ser conhecida como o “formigueiro humano”.
Divisão do trabalho em Serra Pelada
No Garimpo o terreno era dividido em barrancos de 2 × 3 metros, que foram conquistados pela força a princípio, mas posteriormente foram sorteados. Sob a supervisão dos proprietários de cada barranco estava o responsável pelas ordens, conhecido como “meia-praça”, que determinava onde escavar e recebia uma pequena comissão pelo ouro encontrado. Os demais trabalhadores eram chamados de:
- Formiga: Trabalhadores que escavavam o solo, e após encontrar uma rocha, enchiam um saco com aproximadamente 35 kg de terra, e subiam e desciam às escadas improvisadas, chamadas de “adeus mamãe”. Seu pagamento era proporcional ao peso carregado.
- Cavador: Era uma das funções mais importantes, atrás apenas do dono dos barrancos e do “meia praça”. Sua função era martelar as rochas atrás de pepitas, apesar de depender muito da sorte. Alguns encontraram pepitas do tamanho de uma bola de golfe.
- Apontador: Era a pessoa encarregada de anotar o número de sacos retirados pelos carregadores de terra.
- Apurador: Eram as pessoas encarregadas da lavagem, eles escorriam a terra por uma calha coberta de mercúrio líquido. Uma liga era formada pela união da substância com o ouro, que era levada para bateia para separar a liga da terra, após isso, o restante era esquentado para evaporar o mercúrio e sobrar somente o ouro.
A tragédia e o término da era de ouro em Serra Pelada
A exploração de ouro em Serra Pelada teve seu auge entre 1980 a 1983, mesmo com as tentativas do ex-presidente Figueiredo de fechar o local. Em setembro de 1985, após o período da ditadura militar, a Cooperativa de Garimpeiros de Serra Pelada assumiu o controle da mineração de ouro na região. Em abril de 1986, uma mulher foi autorizada a entrar no garimpo pela primeira vez.
Com a queda da produção de ouro, em 28 de dezembro de 1987, os garimpeiros interromperam a ponte rodoferroviária sobre o rio Tocantins para protestar contra a falta de segurança no local e a baixa produção. Eles exigiam que o governo melhorasse as condições do garimpo.
Infelizmente, a situação se intensificou quando a Polícia Militar do Pará desobstruiu a ponte, resultando na morte de garimpeiros. Enquanto a Polícia Militar informou três mortes dentre os manifestantes, os garimpeiros informaram que ocorreram mais de 60 óbitos.
Este trágico evento marcou o fim do auge da produção de ouro na Serra Pelada. A partir de 1987, a produção de ouro começou a declinar e nunca mais atingiu seus níveis anteriores. Em 1988, a produção anual caiu para 745 kg e, em 1990, para menos de 250 kg.
O fim da exploração em Serra Pelada ocorreu em 1992, no mandato do presidente Fernando Collor de Mello, que ordenou o fechamento do local e a retirada das máquinas de drenagem. Foi assim que a água das chuvas e do lençol freático começou a ocupar o espaço.
Em 2020, uma equipe composta por técnicos da Agência Nacional de Mineração e da Defesa Civil de Parauapebas, começaram uma ação para recuperar a barragem de Serra Pelada e minimizar seus riscos e danos potenciais.
Quem detinha a propriedade de Serra Pelada?
O Direito Minerário de Serra Pelada era de titularidade da companhia Vale do Rio Doce, que manteve uma empresa subsidiária no local, sem explorar o mineral. A empresa nunca conseguiu expulsar os garimpeiros da região, e, em 1984, foi aprovada uma indenização à Vale no valor de US$ 60 milhões pelo ouro até então extraído pelos garimpeiros.
Em 2001, o governo concedeu o direito do local para os garimpeiros, mas em 2006 houve um impasse entre o governo, a Vale do Rio Doce e os garimpeiros.
A companhia canadense Colossus Minerals firmou um acordo com a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp), em 2007, visando explorar a região de Serra Pelada. O contrato previa que a Coomigasp teria 49% de participação na mina e a Colossus 51%.
Em 2009, o contrato foi modificado e a Colossus passou a ter 75% de participação. A empresa começou a fazer pagamentos mensais para a cooperativa, mas a maior parte desse dinheiro desapareceu. Após denúncias, o Ministério Público Federal investigou o caso, e, em 2012 a justiça afastou o comando da cooperativa.
Em 2013, a Colossus Minerals enfrentou uma série de manifestações dos garimpeiros em Serra Pelada. O grupo protestava contra a mudança no contrato de compartilhamento de lucros entre a mineradora e a cooperativa. A repercussão do projeto resultou na mudança de vários diretores da empresa, incluindo o CEO Cláudio Mancuso, que renunciou ao cargo em novembro de 2013.
A Colossus chegou a captar recursos na Bolsa de Toronto, no Canadá, porém, o projeto Serra Pelada nunca saiu do papel. Em 2014, devido a dificuldades financeiras, a empresa fechou o seu capital na bolsa e demitiu os funcionários empregados no Brasil. Em 2016, a Colossus deu baixa definitiva no CNPJ da subsidiária brasileira Colossus Mineração LTDA.
Serra Pelada foi o objeto de interesse de inúmeras pessoas visando melhorar suas condições financeiras e ajudar suas famílias. Infelizmente, muitas pessoas morreram em busca do enriquecimento. Embora algumas pessoas tenham alcançado sucesso econômico, a maioria não obteve mudanças significativas em suas vidas. Aproximadamente 42 toneladas de ouro foram extraídas do local. Além disso, estudos geológicos estimam a existência de entre 20 a 50 toneladas de ouro ainda submersas sob o lago.
Filmes e documentários sobre Serra Pelada
A história de Serra Pelada foi retratada em diversas mídias, como filmes, minisséries e documentários. Dentre as adaptações, destacamos algumas abaixo:
Documentário: Serra Pelada — A Lenda da Montanha de Ouro
O documentário investiga as lendas e os fatos por trás de Serra Pelada, trazendo a história pela voz de diversos garimpeiros que trabalharam no local, expondo as dificuldades vividas, a organização do local, a convivência, e a esperança de ficarem ricos através do ouro.
Minissérie: Serra Pelada, A Saga do Ouro
A minissérie conta a história de dois amigos (Juliano e Joaquim) que partem para Serra Pelada em busca de uma vida melhor através do garimpo. Entretanto, a vida difícil, e a ganância, acaba mudando a vida e amizade dos dois para sempre.
Filme: Os trapalhões em Serra Pelada
O filme mostra as trapalhadas de quatro amigos em Serra Pelada, tentando se livrar do controle de um estrangeiro e, ao mesmo tempo, ficarem ricos. O longa foi gravado em Serra Pelada no ano de 1982, e mesmo sendo uma sátira da situação do garimpo na época, pode proporcionar boas risadas.
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Fontes bibliográficas:
INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS (IBRAM). Serra Pelada foi o maior garimpo a céu aberto nos anos 80 [Internet]. [s.d.]. Disponível em: https://ibram.org.br/noticia/serra-pelada-foi-o-maior-garimpo-a-ceu-aberto-nos-anos-80/.
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CRISTAL JÚNIOR. Serra Pelada: O que aconteceu? [Internet]. [s.d.]. Disponível em: https://cristaljr.com/serra-pelada-o-que-aconteceu.
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FOLHA DE S. PAULO. Colossus abandona projeto em Serra Pelada, diz Coomigasp. Folha de S. Paulo, 22 de dezembro de 2002. Disponível em: https://feeds.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc0112200223.htm.
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NOTÍCIAS DE MINERAÇÃO. Colossus abandona projeto em Serra Pelada, diz Coomigasp. Notícias de Mineração. Disponível em: https://www.noticiasdemineracao.com/outros/news/1137341/colossus-abandona-projeto-em-serra-pelada-diz-coomigasp.
Donizete Souza
Aluno do curso de Engenharia de Minas na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e atualmente exerço o cargo de estagiário na Saga Consultoria.
donizetesouza@sagaconsultoria.com